BENFICA!
Este é dedicado ao meu pai, que seguiu as oito finais europeias e que fervorosamente se senta em frente ao ecrã e sofre pelo Glorioso em todos os embates europeus.
Longe estão os tempos em que eu e o meu pai nos orgulhávamos de ir ao velho estádio da Luz, agora remodelado, ver os grandes jogos das quartas-feiras europeias. Ainda sou do tempo de ter visto em campo o Carlos Manuel, o Chalana, Filipovic e o Veloso (nos tempos em que este ainda era novo e até marcava golos de vez em quando). Mais tarde, lembro-me de ver a grande equipa do final da década de ´80 com a defesa Brasileira - ai, que saudades do Moser e do Ricardo - e com o trio sueco a impulsionar o ataque - Jonas Thern, Stefan Schwarz e o inesquecível Matts Magnusson - mais os inolvidáveis Rui Águas, Valdo, Vitor Paneira, Pacheco, e tantos outros nomes que me ficam na memória desses tempos. Esse era o Benfica do Toni e do Sven-Göran Eriksson, o Benfica que ia longe na extinta Taca dos Campeões Europeus e que os adversários temiam encontrar nos sorteios da competicão. Lembro-me que nessa altura os únicos clubes que eu e o meu pai temíamos que o Benfica pudesse encontrar na prova eram os clubes italianos, especialmente o Milão, que se tornou o primeiro clube intocável no ínicio da década de ´90. O resto era trigo limpo para passar em frente. Lembro-me da final táctica de 1988 contra o imbatível PSV-Eindhoven que nessa época lograram levar a Taca da Holanda, o Campeonato Holandês e a Taca dos Clubes Campeões Europeus. O jogo foi extremamente táctico com muito poucas oportunidades de golo e o Benfica acabou por perder a Taca nos penalties com uma oportunidade perdida do Veloso - que infelicidade, depois de um dos seus melhores jogos na sua carreira. Curiosamente, Ronald Koeman era parte desta equipa. Mais tarde lembro-me da final impossível contra o AC Milão, na qual o favoritismo da equipa adversária era tão avassalador (tinha ganho 4-0 contra o Steua de Bucareste no ano anterior), com Frank Rijkaard, Ruud Gullit e Marco Van Basten, Paollo Maldini, Franco Baresi e tantas outras estrelas, que eu e o meu pai apenas esperancávamos por uma derrota honrosa, que veio a acontecer pela diferenca mínima, com um golo de Rijkaard na segunda parte.
Mais tarde foi o grande Benfica que se estreou na nova Liga dos Campeões com o Rui Águas em pico de carreira (jogo funesto aquele contra o Dínamo de Kiev em Kiev na qual ele se lesionou e nunca mais foi o mesmo), Isaías (que grandes jogos que vi gracas a este touro brasileiro - nunca houve uma baliza segura enquanto Isaías estava em campo; os seus remates de meio-campo, muitos para a bancada, é certo, nunca me hão-de sair da memória), e toda a nova geracão que se estreava, Rui Costa, Paulo Sousa, César Brito (dois tiros inesquecíeis nas Antas em 1991 que deram o título mais disputado da história do campeonato português de sempre), e tantos outros. Nesse ano tombarem um gigante, o favorito Arsenal, com uma vitória por 3-1 em Inglaterra (inesquecível golo apertado de Isaías no prolongamento, pressionado por dois defesas ingleses à entrada da área - Nick Hornby imortalizou esse golo na literatura britânica ao referi-lo no seu famoso romance "Fever Pitch"), acabaram por perder a chance de ir à final ao tombarem em Camp Nou com o poderoso FC Barcelona, que rumava esse ano em direccão do seu único título europeu (curiosamente, com um golo isolado contra o Sampdoria por... Ronald Koeman!).
Aparte de uns brilharetes quando tinham 80 % da futura seleccão de ouro portuguesa (Rui Costa, Paulo Sousa, João Pinto, Abel Xavier, entre outros), no início da década de ´90 - inesquecível o jogo contra o Bayer Leverkusson en ´94, já mencionado neste blog, mais o jogo da minha vida, o famoso 6-3 contra o rival nacional Sporting no estádio de Alvalade em 93/94 - o Benfica eclipsou-se durante uma década. O fervor de um adepto esmoreceu-se ao longo de uma década de mediocridade, e o grande Benfica europeu desaparece da memória do resto da Europa. O Benfica deixa de ser ameaca, ninguém o teme. O Benfica é eliminado na taca EUFA por uma equipa semi-profissional sueca, o Halmstad, em que metade dos jogadores são carpinteiros ou canalizadores e jogam à bola nos tempos livres. Mais tarde vem a humilhacão de Vigo, os negros 7-0 que forcaram a um pedido de desculpas oficial por parte do capitão João Pinto dois dias depois, acontecimento nunca antes visto na história do futebol português. Houve até anos em que o Benfica nem sequer se qualificou para a taca UEFA, coisa nunca antes vista experienciada na longa história do clube. O Benfica foi esquecido. Uma geracão inteira de adeptos de futebol na Europa forjou-se sem nunca sequer ter ouvido falar do Benfica.
Este ano estou orgulhoso. Pela primeira vez depois de uma década inteira de desilusões, vê-se o Benfica ao nível que os adeptos mais velhos estavam habituados a ver. Um Benfica com uma defesa sólida e louvada pelos comentadores europeus e um contra-ataque temido pelas maiores equipas europeias. Um abate-gigantes que já expulsou da competicão tanto o Manchester United como o campeão em título Liverpool no seu próprio estádio, com dois golos fantásticos. E agora enfrentam o Barcelona e recebem louvores de respeito por parte do adversário, talvez o favorito na edicão deste ano da competicão. Não acredito que o Benfica siga em frente, embora bem gostasse que acontecesse, mas gostei da exibicão deste ano. Aconteca o que acontecer no jogo da segunda-mão dos quartos de final, já valeu a pena. Novamente, o Benfica aparece em destaque nos diários desportivos europeus. Como a surpresa da prova. Uma década inteira de fracassos muito danificaram o prestígio do clube. Ontem reparei na transmissão televisiva do Sky Sports que as bolsas de apostas britânicas colocam o Benfica na última posicão como possível vencedor do título (odds 28/1). Aqui na Noruega ninguém conhece o Benfica e frequentemente me irrito com os comentários dos estudantes noruegueses ou com os comentários nos jornais sobre o "lille Benfica som med en del flaks tok fordel av de svekket Man U og Liverpool i år" ("pequeno Benfica que com muita sorte se aproveitou dos maus momentos de forma do Manchester United e do Liverpool") . Ou de ouvir comentários na televisão como "de spiller bra, disse kortvokste portugisere" ("jogam bem, estes anões portugueses") ou "0-0 så lenge er ren mirakel for Benfica del" ("0-0 até agora neste jogo é puro milagre, por parte doBenfica"). Acredito que no resto da Europa os comentários são os mesmos. Os aficionados comparam as prestacões do Juventus, do Arsenal, do Barcelona, a campanha incrível do Lyon este ano. Ninguém se preocupa com o Benfica. O Benfica foi esquecido. O futebol europeu precisa de um empurrão para refrescar a memória. Talvez uma vitória em Camp Nou?