quarta-feira, abril 19, 2006

Cemitério de namoradas.

Todos os nomes são falsos e os detalhes alterados, de forma a proteger as identidades. As emocões descritas, infelizmente, são reais.

Kristine acabou a relacão comigo porque achava que as nossas personalidades eram incompatíveis. Signe via as nossas diferencas de fundo cultural como um obstáculo intrasponível, para além de se ter mudado para Oslo três semanas depois de termos comecado a sair juntos. Mari mudou-se para a Irlanda depois de cinco meses juntos comigo. Entretanto arranjou um par de sucessores. Jane não queria uma relacão séria. Kaia vivia na Alemanha, e nunca mais a vi. Alex voltou para a Polónia e vive feliz numa relacão estável que tem durado à mais de três anos agora. Helen considerava a distância entre a sua cidade-natal na Dinamarca e o meu local de trabalho em Trondheim como um fardo económico. Inger nunca me respondia aos telefonemas, e quando o fazia era extremamente evasiva. Hilde confessou a sua paixão por mim na última semana antes de voltar para a Alemanha, e embora fosse uma atraccão sobejamente recíproca, falhou por tardar. Kristi rejeitou-me por vivermos no mesmo apartamento - pelo menos essa foi a desculpa oficial. Frederika continua a telefonar-me regularmente, e continua tão simpática como sempre. Entretanto pensa em casar com o seu namorado austríaco, e vivem felizes juntos em Cascais. Birte decidiu acabar o curso de medicina no Brasil e nunca mais me telefonou. Creio que ainda está recentida pela maneira como terminei com ela. Eirin arranjou emprego como observadora internacional na fronteira afegã. Nunca descobri se as minhas suspeitas sobre a maneira como ela me olhava enquanto falávamos escondiam algo mais para além de interesse intelectual. Tine- era Tine ou Stine? - nunca mais telefonou depois daquela noite. Tove era demasiado alta. Turhild j´tinha namorado. Åsa dormia com todos e Vanja só dormia com Jesus. Johanne escreveu-me muitas e longas cartas, mas nunca se atreveu a encontrar-me, mesmo depois das minhas cinco visitas a Gotemburgo para encontrá-la....


Etc, etc, etc, etc...

Quando é que esta história acaba?

Acorda um homem um dia com a ressaca de ter 28 anos e continuar solteiro, solteirissimo, solteirão. Entretanto casaram-se, ou estão a caminho de o fazer, todos os colegas de escola, de curso, de emprego, com algumas raras excepcões. O Manuel, que prefere a sua guitarra aos prazeres ilícitos com o sexo oposto. Ou o João, cujas visitas assíduas ao bordel local satisfazem as necessidades. Ou a Andreia, que muitos não têm a certeza de ser homem ou mulher depois do primeiro encontro. E eu. Naturalmente. Sem saber muito bem porquê, embaracado de me incluir neste grupo.

As noites e os fins-de-semana preenchem-se com idas ao cinema, livros, muitos livros, teatro, internet, e, inevitavelmente, trabalho. E viagens. Sempre sozinho. Uma pessoa habitua-se a ter os seus próprios pensamentos como companhia.

Sexo é algo que se vê na televisão e cuja vida nos premeia muito ocasionalmente, frequentemente associado com alcoól, raramente duas vezes seguidas com a mesma pessoa. Amor está na mesma categoria semântica que conceitos como vida extraterrestre, Sporting campeão europeu e fusão nuclear a frio. Saudade é um luxo precioso, cuja expressão pública confunde-se com stalking. Desilusão é mau perder, tristeza um mal privado. Intimidade, tanto física como emocional, um sonho e uma utopia irrealizável.

Calculo que um terco da minha vida adulta foi perdida em melancolia e tristeza associada a solidão ou desgostos de amor. Com evidentes consequências na vida profissional, para além do desgaste psíquico na vida privada.

Acontece-me frequentemente remeter-me a passeios por paisagens imaginárias, cenários desenterrados da memória, de mãos dadas com os fantasmas que o olvido tomou, em diálogos longos e profundos com os espectros do meu passado. No meu cemitério de namoradas, lajes de côres, cheiros e experiências que não voltarão jamais.

Uma última e única arma resta-me no meu arsenal, para além do cinismo e da indiferenca. Sorrir. Sorrir é a última esperanca e o último consolo. Uma vez perdida a capacidade de sorrir, então já não sobra nada.

:-)

6 comentários:

Anónimo disse...

Como eu te compreendo. Sempre tentei manter relações estáveis, quer por defeito de educação tradicional que tive, quer por não ter paciencia nem confiança para andar à pesca! A estabilidade foi-se prolongando até que chega a altura de cada qual seguir a sua vida...E o que fica para trás? O vazio. A impressão de que se perdeu tempo, de que, mais uma vez, falhámos, que não fomos talhados para isto!

Apetece estar sozinho, que ninguém nos chateie. Ao mesmo tempo apetece voltar atrás, aos tempos de secundário onde mais importante que relações amorosas eram as relações de amizade- Voltar ao preparatório onde o que importava mais era jogar à bola e as mulheres eram, já então um bicho complicado, ou voltar à primária, onde o intervalo parecia não ter fim, ao contrário dos dias de hoje onde o intervalo acaba quando parece que ainda não começou! O sentimento de solidão quase que se esvanece quando se pensa nos bons amigos. Mas será que eles ainda lá vão estar para nos aturar! Será que não encontraram a sua cara metade e, como quase sempre nestas situações, se esqueceram que continua a existir uma vida lá fora e que sendo esta ignorada, corre-se o risco de um dia quando dela precisarem esta já lá não estar!?

O que resta então? Enfiar-nos no trabalho como falas? Por um lado sim, mas primeiro é preciso que a cabeça decida isso e que o corpo deixe o estado de apatia em que parece ter estacionado! Por outro lado vale-nos o sonho, os planos de grandes aventuras que a vida nos reserva! Isto se pelo meio não se der com o nariz na porta de outra e ao pensar-se "É desta" esquecemo-nos outra vez dos planos e dos sonhos que fizemos!

Que é que eu tenho para te dizer...O único motivo para estares nesse estado depressivo é a pressão que a sociedade coloca em cima de ti! Tirar o curso, casar e ter filhos... Só tens 28 anos, tens a vida toda à frente, por que raio é que fazes disso um cavalo de batalha!? Um dia quando menos esperares encontras alguém com quem decidirás partilhar a tua vida. Até lá goza-a e pelo que li, parece-me que a tens gozado bem ;)

Abraço

Anónimo disse...

Nem sei o que dizer: se é "vai em frente e investe com mais força" ou "deixa que as coisas acabam por acontecer" ainda assim, deixa que te diga que, achei o texto simplesmente faboloso.
Não há receitas num jogo e que nós só somos metade.

De resto, ao ler este teu texto, eu até... não... esquece... afinal moramos muito longe ou do outro... e já não falamos pessoalmente há uns anos... e tu nunca me ligaste... e não sei até que ponto encaixaríamos... àh e... é verdade... eu também sou gajo e não me parece que esteja(s) para aí virado!

:))))))

Abraços fortes

Rui Neves

viking disse...

Ahahahah, estes comentários estão ainda melhores que o texto original!

Nunca pensei que o meu "desabafo" sobre as minhas frustracões com o sexo oposto despertassem tais reaccões.

Já agora, só uma nota: eu não estou deprimido agora ou em baixo; este texto espelha esses momentos de tristeza, mas não descreve uma situacão particular actual. Acho que todo o solteirão que se preze já pensou nestas coisas, pelo menos uma vez!

Portem-se bem!
:-)
Paulo.

Anónimo disse...

Eu costumo pensar, porque raio é quee nao consigo manter uma relaçao estavel por mais do que uns míseros meses (a mais longa foi de 10 meses e só a via de mês a mês). Grande parte das "frustações" que tu sentes muitas outras pessoas as sentem também e eu não sou excepção. Mas o que eu costumo fazer é levantar a cabeça, ocupá-la com outras coisas para não pensar muito no assunto...porque quando menos espero, lá aparece alguém...por mais uns míseros meses.

Anónimo disse...

Soberbo!
Virgilio

rita disse...

Que espectáculo de texto! Adorei, adorei, adorei... Não consigo deixar de me identificar com todos esses sentimentos e tu (d)escreveste-os soberbamente.
Um grande sorriso para ti! :)